sexta-feira, 20 de junho de 2014

só consigo escrever angustiada?

tiro ao alvo.
ouço o disparo
e ao mesmo tempo a placa pendulando raivosa.
como um operário que bate o chão com a marreta
metal-concreto
som seco

o tiro é tão rápido,
que o som do encontro entre ar e projétil
dança com o ressoar do encontro com o alvo

nunca soube de qual lado vem o tiro
a memória da infância deixou montado
o cenário do fuzilamento

por dez anos
esquece-se que o tiro
é tiro.

e passa-se a ouvir obra
do operário
batendo o chão com a marreta.

-\-

me vejo no treinamento
não mais localizado à esquerda do meu pensamento,
pois me lembrei do eco
e de que nem tudo vem
de onde parece vir.

me vejo no treinamento,
me lembro do agronegócio, mas, por acaso.
(a angústia
o apego
a vontade de ir embora
me fazem prestar a atenção
em todos os sons
comuns
que em breve não serão mais ouvidos;
em todos os livros não lidos;
em todos os conflitos da prática urbana dos edifícios [vizinhos];
o aproveitar cada momento
mas lembrar do tédio
da improdutividade
parece um tiro ao alvo)

a exploração aqui
vem de quem dá os golpes de bodão
em si mesma.

estou no treinamento
e atiro
como o operário
num ritmo equilibrado
mas não sei se posso
pois o peso da marreta
puxa o ritmo do operário
e o empurrão da arma disparada
reflete no meu corpo para trás.

atiro pensando na vida da bezerra
e quando me dou conta,
resolvi procrastinar
a busca pela felicidade.

a preguiça
me pôs no alvo
e pegou a arma

não atirou.

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